por psicóloga Lêda Milazzo (CRP 09/10898)
Para os amantes de Grey’s Anatomy, fica a dica: Station 19 é derivada tão famosa série. E em várias ocasiões, a gravação é no Grey Sloan Memorial Hospital, que fica uma quadra de distância do quartel.
Então vamos falar de Station 19? A série tem 2 temporadas e 27 episódios, com previsão de lançamento da terceira temporada em janeiro/2020.
Estação 19, também poderia ser Consultório 19? Acredito que sim!!
Assistindo a série Station 19, percebi que existem algumas semelhanças no trabalho realizado pelos bombeiros e nós, psicólog@s, especialmente quando lidamos com perdas, morte e luto.
A série retrata o cotidiano de uma equipe de bombeiros que precisa lidar com a pressão, agilidade, flexibilidade para auxiliar vítimas em situações adversas.
Medos, dúvidas, incertezas diante da finitude da vida são apresentados a todo momento, sejam pelas vítimas ou pelos próprios profissionais. Qualquer semelhança (com @ psicólog@), NÃO é mera coincidência. É fato!!
Lidar com o outro exige, além da técnica e teoria, o autoconhecimento, criatividade, resiliência, saber até onde vai o seu limite e, claro, muuita terapia. Ah, e umas supervisões também são muito bem-vindas, não é mesmo?
Em hipótese alguma, tenho a intenção de dizer que bombeiros e psicólogos fazem a mesma coisa. A ideia é ampliar a reflexão de como é difícil para um profissional lidar com situações extremas e como é importante falarmos de assuntos delicados, talvez, assustadores para alguns. E um desses assuntos é a morte.
Culturalmente, não falamos sobre a morte, sobre o morrer, sobre nossos medos. Medos “dela”, medos da morte. É como se existisse uma nuvem sombria em torno do tema. Até “apelidos” são utilizados para não se falar a palavra morte ou morreu: “fulano partiu”, “ a tia Celeste buscou”.
Uma das personagens (Victória Hughes – Vic), que é da equipe dos bombeiros, tem medo de incêndio, do fogo. o que pode nos dar margem para interpretar também como um medo da morte. Parece incoerência?! Talvez não. A mim, parece que existe um ser humano, antes de existir um profissional. E está tudo bem.
Muitas vezes, no exercício da profissão, as situações dos clientes/pacientes vão de encontro com dificuldades do próprio terapeuta. Assim, como na série. Por exemplo, o capitão Pruitt Herrera descobre e esconde seu diagnóstico de câncer. Poupar a filha de mais um luto ( a mãe já morreu) ou negação da doença? Medo da morte ou de achar que está sendo “fraco”? Ainda seria precipitado apontar uma resposta.
Diante da doença do pai, Andy demonstra vários comportamentos apontados na literatura, conhecidos por “fases ou estágios do luto”.
A raiva de não ter sido comunicada. Depressão (não se trata do transtorno depressivo) ao se isolar, chorar. A aceitação quando conversa com o pai no leito do hospital e se dispõe a ajudá-lo, mesmo contra a vontade dele.
O capitão Herrera também apresenta esses momentos frente ao diagnóstico. A todo instante nega estar doente ou debilitado, inclusive não aderindo, inicialmente, ao tratamento e ignorando as recomendações médicas. Raiva quando a filha fala para não trabalhar, jogando o talher no prato e dizendo que não vai mais comer. A aceitação vem com o tempo, já com o capitão um pouco mais debilitado. Ele passa a aceitar o tratamento, mesmo os mais agressivos.
Enfim, ficar frente a frente com a possibilidade da sua morte ou da morte de uma pessoa significativa não é nada fácil, não é nada simples. Só que vou um pouco além, não é só a morte de pessoas próximas que nos abala. Intervir em situações de perdas e luto dos nossos pacientes também não é nada fácil, não é nada simples.
No episódio 3 da primeira temporada, conversando com seu pai, Andy diz uma frase que me chama muito a atenção: “É que é tão difícil sentar e não se envolver com tudo, sabe?!” E é justamente assim que, às vezes, nos sentimos no setting terapêutico, com o nosso cliente relatando suas perdas, suas dores. A “tal” neutralidade fica ainda mais impossível. Afinal, repito, estamos diante de um SER humano e o psicólogo é também um SER humano.
É claro que tem um limite, não vamos soluçar de tanto chorar com o cliente, mas podemos sim compadecer de seu sofrimento, podemos nos emocionar. Aliás, esse é um dos grandes motivos para estarmos em terapia e supervisão. É preciso ter cuidado para não se queimar...
Se você nunca assistiu à série, super indico. Especialmente, se atende ou tem interesse em atender pessoas em processo de perdas e luto, incluindo o luto antecipatório (diante de um diagnóstico sem prognóstico de cura).
E se quiser compartilhar o que achou do texto, bater um papo sobre o assunto ou conhecer um pouco mais sobre a temática estou à disposição. Você me encontra pelo WhatsApp (62)99951 1300, no insta @leda.milazzopsi e no site www.ledamilazzo.com.br.
Lêda Cristina Pinheiro Milazzo, psicóloga (CRP 09/10898), especialista em Psicoterapia Analítico-Comportamental e com especialização em Tanatologia: Sobre a Morte e o Morrer. Atualmente, cursando a pós-graduação em Psico-oncologia. Além do atendimento clínico, auxilia colegas psis a serem fonte de apoio a seus pacientes/clientes para que possam entender e vivenciar os processos de luto de forma saudável.. Para que os enlutados, que busquem a ajuda desses profissionais, consigam viver o luto e não sobreviver de luto.
Texto maravilhoso. Muito interessante suas análises👏👏👏