por Giovanna de Boni Fraga - CRP 07/29470
Se você, assim como eu, adora séries nostálgicas, repletas de drama e com toque de diversão, De Volta Aos 15 é a série ideal para colocar um sorriso no rosto e deixar o coração quentinho. Com seis capítulos de menos de quarenta minutos, acompanhamos a história de Anita, uma mulher de trinta anos insatisfeita com a vida, que volta à cidade natal para o casamento da irmã mais velha, Luiza. Incomodada com o modo habitual com que o povo da sua cidade seguia levando a vida, Anita resolve falar algumas verdades guardadas há anos para a desaprovação da família, principalmente da irmã. Luiza não gosta nada da confusão, e alerta Anita que ela não tem mais quinze anos para dizer tudo o que vem na cabeça sem pensar nas consequências. Frustrada com o ocorrido, Anita corre para o seu antigo quarto, onde as lembranças do passado a atravessam como se fosse um fantasma do presente. Neste momento, Anita se dá conta de todos os sonhos que deixou de sonhar. Então, de repente ela lembra da conta do Floguinho, onde ainda mantinha as lembranças de quinze anos atrás. E é nesse instante que tudo começa a mudar.
Com a ajuda do Floguinho, Anita volta para o ano de dois mil e seis quando ainda tinha apenas quinze anos de idade. Num primeiro instante, ela acredita se tratar de um sonho, já que retorna exatamente para o pior dia da sua adolescência: o primeiro dia de aula do colegial. Nesse dia, Anita sofreu um dos seus piores traumas da sua vida até então, onde teve de ouvir insultos e piadas de mal gosto dos maiores bullies do colégio. Por isso, se pudesse voltar no tempo, não seria para aquele dia, nem mesmo nos seus piores pesadelos. Mas como não tinha certeza se aquilo era real ou não, Anita decide fazer diferente e falar tudo aquilo que estava engasgado há anos. Afinal já não se importava com o que poderiam achar ou não dela. Até porque tinha trinta anos no corpo de quinze, e isso sendo um sonho ou não, ela jamais iria desperdiçar a chance de dizer tudo o que há tantos anos queria expressar. Foi assim, por conta dessa atitude corajosa, que ao entrar outra vez na conta do Floguinho ela criou uma nova versão de si mesma.
Nessa nova versão, Anita não morava sozinha em um pequeno apartamento na cidade de São Paulo, ao invés disso, dividia o espaço com Camila, uma amiga que fez durante o seu retorno inesperado ao passado. O resto de sua vida, porém, seguia o mesmo padrão de quando tinha ido até a sua cidade natal para o casamento da sua irmã. Anita então decide entrar mais uma vez na conta do Floguinho para ter certeza de que era isso que a fez regressar ao passado. E como uma falha no sistema, lá estava ela de novo em sua versão adolescente, revivendo conflitos e confusões da adolescência com seus trinta anos de idade. De todas as coisas estranhas nessa viagem no tempo, a mais peculiar era ter de passar novamente por alguns acontecimentos específicos, como era o caso da aula de física. Porém, como se encontrava ali, naquele exato instante com aquelas determinadas pessoas, não via por que não mudar o passado para transformar o futuro. Afinal, o que poderia acontecer de tão ruim se mudasse para melhor um detalhe que outro?
O primeiro passo no seu plano de futuro era afastar a prima Carol do namorado Eduardo. Anita não gostava do rapaz e não entendia o que o pessoal da cidade via nele, pois para ela, ele era um atraso na vida de Carol. Então, por querer o melhor para sua prima, eles precisavam terminar com essa história entre os dois antes mesmo de começar. Anita armou um plano elaborado com a ajuda de um dos valentões da escola e suposto amigo do Eduardo, Fabrício, que no início não entendeu o motivo, mas aceitou com o intuito de ser ajudado depois. Assim, com o plano posto em prática, Anita conseguiu o que queria, porém não do jeito que imaginava. Pois não tinha como prever os mínimos detalhes para que tudo saísse conforme o planejado. Afinal, ela estava tentando ajudar, e não iria desistir até que seus amigos tivessem um futuro do qual valesse a pena viver. Assim, concluído o plano de separação do relacionamento tóxico de Carol com Eduardo, Anita deu início a uma série de planos que deram errado. Como ajudar Fabrício a conquistar Luiza, incentivar César a investir no Léo, prevenir Joel dos falsos amigos e assim por diante. Só que quanto mais tentava ajudar os amigos, mais bagunçava a vida deles tanto no passado quanto no futuro.
Isso porque Anita queria que tudo fosse perfeito. Demorou muito até entender que a vida é imperfeita. Ela teve de errar bastante tentando consertar as coisas para se dar conta de que não tinha controle sobre absolutamente nada, pois era impossível controlar tudo e todos a cada instante. Uma simples mudança fazia toda a diferença, pois cada detalhe alterado no passado, por menor que fosse, abria uma série de possibilidades infinitas no futuro. Então não tinha como Anita estar um passo à frente de todos os possíveis acontecimentos que viessem a acontecer, mesmo vindo do futuro nem tudo poderia prever. Essa era a parte mágica e ao mesmo tempo frustrante de se viajar no tempo: nunca saber o que esperar do que as próprias escolhas seriam capazes de criar. Anita tentava manter-se aberta às possibilidades infinitas criadas pelas suas próprias decisões, mas isso era porque esperava sempre mais. Tanto mais das coisas boas como ruins. Provavelmente por conta da sua vida anterior ao Floguinho ser sempre mais do mesmo em um inconformismo sem fim, ela esperava que as coisas mudassem e deixassem de ser daquele jeito sem jeito de ser. Com isso ela criou uma nova versão, onde não retornaria mais ao modo antigo em que vivia. Agora seguiria em frente, em busca da melhor versão de si mesma.
Através da jornada de Anita podemos refletir que para criar novas e melhoradas versões precisamos aprender algumas lições importantes. Começando por entender que se não estamos satisfeitos com as nossas próprias escolhas, precisamos fazer algo sobre isso. Também é necessário compreender que a perfeição em cada detalhe não existe, ela é irreal, porque nós somos imperfeitos. Aliás, viver dos nossos sonhos pode ser uma realidade se nos empenharmos, ao invés de nos impedirmos. E não adianta querermos o melhor para a nossa vida, esperando sempre pelo pior. A dor é real, mas continuar com o sofrimento é tortuoso e opcional. Não podemos fazer como Anita que jogava suas dores e feridas debaixo do tapete como se assim deixassem de existir. Nós temos de encarar, para que elas possam se curar, e possamos seguir em frente com mais harmonia e leveza. Até porque não controlamos aquilo que nos acontece, mas podemos controlar como reagimos e as escolhas que fazemos diante disso. Isso significa que aquilo que passou traz uma lição valiosa para ser integrada, perdoada e compreendida pela nossa nova e melhor versão. Cada aprendizado traz consigo um passo além na nossa jornada evolutiva. Quanto mais compreendemos as lições, mais criamos novas e melhoradas versões de nós mesmos.
Podemos ver que a série De Volta Aos 15 traz diversas lições sobre as versões que desejamos desenvolver ao longo da vida. Claro que não podemos voltar ao passado como Anita fez, mas podemos repensar e questionar antigos padrões para fazer diferente. E mesmo que mudar seja um processo lento, ele acontece no tempo de desenvolvimento de cada um. Aliás, uma outra lição valiosa que a série nos ensina sobre novas versões é sobre o autoconhecimento. Porque se prestarmos atenção na história de Anita ou a nossa própria, conseguimos entender que o autoconhecimento não vem no silêncio da noite no escuro, e sim na multidão barulhenta da claridade do dia a dia. São através das dinâmicas de relações que aprendemos mais sobre quem realmente somos. Aqueles que estão ao nosso redor dizem muito sobre nós. Afinal de contas, somos sociáveis por natureza. E por fim, quero deixar uma última reflexão de um momento na série em que a Anita do passado e do presente se encontram, e a antiga diz o seguinte: ‘’olha o tanto de coisa que precisou acontecer para você chegar até esse momento. Não deixa isso passar.’’ Na vida, passamos por diversos acontecimentos bons e ruins. Nem sempre tomamos todas as lições para curar e criar novas versões. Mas aquilo que captamos e integramos como parte da nossa jornada evolutiva, é o ponto chave para nos tornarmos a nossa melhor versão.
Giovanna de Boni Fraga é escritora e psicóloga, formada pela PUCRS. Idealizadora do Projeto Porta Adentro: relatos de tempo em casa; Coautora do aplicativo Amar é; Editora da equipe Psicologia em séries. Através do autoconhecimento e da escrita terapêutica ajuda pessoas a se conectarem com a sua própria criatividade para a resolução de problemas. Atende crianças, adolescentes e adultos de forma presencial na cidade de Osório - RS, e online para as demais cidades do Brasil. Seus interesses estão voltados no desenvolvimento do autoconhecimento através da escrita terapêutica, na criatividade como resolução de problemas, e na saúde e bem-estar através da atenção plena.
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e-mail: giovannafragapsico@gmail.com
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