por Rodolfo Sampaio (CRP:06/111804)
Em janeiro de 2021, a primeira parte de Lupin chegou à Netflix para conquistar o posto de melhor série daquele mês. O sucesso quase que absoluto não foi novidade para quem já conhecia a obra original, que serviu como inspiração para a produção, no caso, o romance intitulado: Arsène Lupin - o ladrão de casaca.
Sem querer dar spoiler (não muitos, prometo), vou te contar que o personagem principal se chama Assane e que ele, ao descobrir uma injustiça feita a seu pai, fará de tudo para vingá-lo.
Talvez, lendo até aqui você considere que essa seja apenas mais uma trama comum sobre vingança familiar. E talvez fosse, caso esse mesmo Assane não se tornasse um ladrão extremamente habilidoso em ser simplesmente quem ele quiser.
Ainda criança, ele ganha de presente do pai o livro de Lupin e, encantado pelas habilidades daquele personagem, decide se aprofundar em todas as obras que contam as incríveis aventuras do ladrão.
Já adulto, com muita habilidade e alguns recursos financeiros, Assane se torna alguém capaz de entrar em qualquer local sem ser notado, assumindo o lugar de faxineiros, empresários, entregadores ou qualquer outra pessoa que ele queira.
Essa capacidade é muito bem utilizada para prender o espectador durante os episódios, uma vez que não faltam cenas empolgantes de ação e muito suspense.
Outra grande sacada da série é de nos deixar confusos quanto a real personalidade de Assane, principalmente nos primeiros episódios, já que ele assume tantos papéis diferentes que se torna quase impossível reconhecer quem de fato ele é.
Com o passar da história, vai ficando claro quem realmente ele é e os reais motivos pelos seus comportamentos. Nesse momento, o conhecendo melhor, temos a possibilidade de enxergar o quanto todo aquele glamour inicial é na verdade envolto em muitas angústias e fragilidades.
É curioso olhar para esse personagem, até então com uma vida incrível e cheia de aventuras, e considerar que todos temos um pouquinho dele, já que assumir papéis sociais diferentes é algo tão natural que mal percebemos.
Não sei o quanto esse conceito é claro para você, então cabe uma pequena explicação. Os papéis sociais são formas de comportamento previamente estipuladas para os indivíduos de uma posição social específica. Difícil ainda? Então pense em como você se comporta quando está com seus pais e reflita como o seu comportamento muda quando está em uma reunião profissional. Agora, compare com o modo como você trata seus melhores amigos.
Durante toda a nossa vida somos alguém a partir de um papel social, agindo com base em algo que é esperado socialmente de nós. Talvez você questione se há algum papel social em cena quando estamos sozinhos e a resposta é sim - e não.
Isso ocorre porque, quando ninguém está perto da gente, podemos de fato ser quem quisermos. Mas, ao mesmo tempo, sabemos exatamente quais comportamentos são esperados de nós, mesmo que ninguém esteja vendo.
Agora que essa definição está mais clara para você (eu espero que esteja mesmo), te convido a imaginar como seria ter uma vida na qual utilizamos os papéis sociais como disfarces, com a intenção de que ninguém realmente conheça quem somos.
Essa é a vida de Assane, alguém que constantemente oculta sua real personalidade, um homem que dispõe de muita competência em ser alguém que não é, uma pessoa que ninguém parece conhecer verdadeiramente.
Não sei como você absorve tudo isso que leu até aqui, mas conheço pessoas que consideram fascinante pensar em fazer tudo que esse personagem consegue, ainda mais quando as aventuras em torno dele são cheias de charme e elegância.
Apesar desse fascinante mundo de possibilidades, é impossível negar que Assane (ou qualquer pessoa) não se depare com consequências negativas nesse modo de viver.
Sejam quais forem os motivos, mascarar quem somos é uma escolha que tende a nos afastar de relações, sentimentos e emoções genuínas. Nos distancia daqueles que estão ao nosso lado e, mesmo com possíveis benefícios, os riscos são permanentes.
É importante dizer que a ideia desse texto não é provar que Assane está errado por agir assim, principalmente por que no decorrer da série conseguimos entender algumas de suas motivações. Minha intenção é fazer você observar de maneira mais ampla como os papéis sociais nos afetam positiva e negativamente.
Ah, e se você ainda não assistiu LUPIN, talvez valha a pena dar uma chance e, nem que seja por algumas horas, assumir o papel social de alguém que maratona uma série depois de ler sobre ela em um blog.
Rodolfo Sampaio é psicólogo Rodolfo Sampaio (CRP:06/111804) com experiência em Saúde Mental, trabalho psicoterapia online, palestras e grupos com temáticas relacionadas a qualidade de vida e bem estar emocional. Coautor do livro: "O poder da autoestima" e idealizador do projeto "Mais Psicólogos"
Email: maispsicologos@gmail.com
Instagram: @psirodolfosampaio
Youtube: Mais Psicólogos
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