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Cobra Kai – Será que toda agressividade é ruim?

por Andrey da Silva Aires - CRP 07/33087


A quarta temporada da série Cobra Kai da Netflix trás Johnny Lawrence e seu novo Eagle Fang Karate se unindo a Daniel LaRusso e seu Miyagi-Do para vencer no torneio do All-Valley Karate contra seu inimigo em comum: John Kreese e seu dojo, o Cobra Kai. Se você assim como eu acompanha a série, a situação que vemos nessa temporada já era conhecida desde o final da terceira temporada, o que pode ser novidade, no entanto, é que vemos Daniel e Johnny precisando aprender a trabalhar em conjunto, unindo suas visões divergentes sobre Karatê.

A série de filmes Karatê Kid assim como o conjunto da obra Cobra Kai é sobre o conflito agressividade vs controle, conflito esse exemplificado pelas filosofias opostas dos personagens principais: Johnny e Daniel. A vida, no entanto, não é tão simples, e o seria muito complicado (para não dizer impossível) ter absoluto controle sobre nossas reações, especialmente em momentos difíceis, que é quando nossa agressividade interna tende a sair de controle.

Algumas das reações humanas mais comuns a quaisquer coisas envolvem a agressividade. Todo o espirito que embasa o estilo Miyagi-Do vem da ideia de que devemos controlar e, segundo a série, abandonar a ela. Em contra partida, os estilos Cobra kai e Eagle Fang são firmemente baseados no direcionamento da agressão, em geral, ao seu oponente. Esses são pontos que fazem com que essas ideias sejam aparentemente paradoxais, mas nesta nova temporada, Johnny passa a ensinar os estudantes do Miyagi-Do e Daniel passa a ensinar os estudantes do Eagle Fang.

Para esta discussão progredir precisamos estabelecer uma coisa: agressividade, assim como sentimentos e sensações associadas a ela como a raiva, por exemplo, são naturais do ser humano, e não há pessoas que não vivenciem isso. Para fins dessa reflexão, vamos nos referir apenas à agressividade, e vamos defini-la como um impulso interno que nos faz agir. Genérica essa definição não é mesmo? Mas será que ela pode ser mais específica?

As coisas mais comuns que associamos com a palavra “agressividade” tem a ver com violência: bater, morder, xingar, gritar, etc; e isso não é falso, estas são todas manifestações agressivas (e naturais) do ser humano. Mas todos sabemos que nossos impulsos precisam ser controlados, e assim, precisamos encontrar formas de fazer isso com a agressividade também. Nossa agressividade pode ser canalizada e direcionada a formas que não são violentas e por que não? Podem até ser produtivas.

Podemos ver essas canalizações produtivas de forma mais obvia quando pensamos em esportes de impacto como futebol, basquete, qualquer esporte marcial, entre outros. Mas e se estivéssemos pensando em manifestações menos físicas da agressividade? Lutar contra injustiças ou mesmo se posicionar frente a situações problema, e quem nunca ouviu a frase “eu fiz (algo) na força do ódio (ou da raiva)” quando falam sobre algo que não quiseram, mas precisavam fazer?

Quem lendo isso não consegue relembrar uma situação onde precisou “se empolgar” ou “ficar no hype” para fazer alguma coisa? Estes momentos onde vivemos uma sensação de impulso, algo que nos da energia e nos motiva, nos empurra a frente e impulsiona também podem ser manifestas de agressividade, ainda que direcionadas de modo adequado a objetivos. Mesmo em nossos relacionamentos íntimos uma certa quantidade de agressividade pode ser percebida como algo bom, que movimenta o casal e que pode gerar uma espécie de tensão prazerosa em ambos.

Parece claro a todos que assistem que Johnny precisa muito aprender a controlar seus impulsos, e parte de sua jornada tanto nesta quanto nas temporadas anteriores tem a ver com ele aprendendo a incorporar as filosofias do Miyagi-Do em sua vida. Menos obvio, no entanto, é a necessidade de Daniel aprender primeiramente a reconhecer sua própria agressividade. É um lindo e utópico conceito essa ideia de “abando a agressão”, mas na prática significou que ele apenas passou a ignorar essa parte de si. Precisamos encontrar um lugar para a agressividade em nossas vidas, já que sem ela, talvez não tenhamos tanta força para alcançar nossos objetivos.

Alguns dos momentos mais catárticos desta quarta temporada tem a ver com Daniel expressando sua agressão, seja batendo em bullies de um time de hockey ou disciplinando seu filho Anthony. O Miyagi-do, desde a série de filmes foi sobre controle, não sobre desapego, e nós não precisamos desapegar de partes de nós mesmos, afinal plenitude vem do controle e não da ignorância. Se você levar uma lição desta reflexão, que seja esta: agressividade e violência NÃO são sinônimas. Não precisamos ser karatekas para incluirmos as lições do Sr. Miyagi e até mesmo algumas lições de John Kreese em nossas vidas, já que se considerarmos que ambas as filosofias estão em extremos opostos de uma linha, o bem estar se encontra entre elas.



Andrey da Silva Aires é psicólogo clínico de indivíduos, famílias, casais, pós graduado em psicologia e sexualidade e mestrando em psicologia.

Também é criador da página @andrey.aires.psicologia no Instagram e Facebook onde desenvolve um trabalho focado em abordar conceitos da psicologia de um jeito simples, muitas vezes usando a cultura pop como paralelo para nossa vida.



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